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MP não vê provas contra soldado israelense investigado no Brasil – @gazetadopovo



O Ministério Público Federal (MPF) afirmou não haver provas que confirmam a participação do soldado israelense acusado por uma ONG pró-Palestina em crimes de guerra na Faixa de Gaza. Em parecer obtido pela Gazeta do Povo, o procurador Marcus Marcelus Gonzaga Goulart diz que as provas apresentadas contra ele, no Brasil, “foram produzidas unilateralmente por particulares e não confirmam, de forma inequívoca, a participação […] nos atos invocados”.

No documento, o órgão diz ainda que não há sequer prova de que ele tenha matado alguém no conflito. As imputações feitas a ele, diz ainda o MPF, podem não passar de “narrativas”. A Gazeta do Povo optou por não difundir o nome do militar israelense, que teve que deixar o Brasil às pressas no fim de semana.

Ele passou a ser investigado pela Polícia Federal a partir de um pedido da Fundação Hind Rajab, uma ONG pró-Palestina sediada na Bélgica que promove ações judiciais no exterior para prender militares israelenses envolvidos na guerra contra o Hamas. No fim de dezembro, em nome da entidade, dois advogados de São Paulo apresentaram à Justiça Federal da Bahia um pedido para prendê-lo, após descobrirem, nas redes sociais, que ele passava férias em Morro de São Paulo, tradicional destino de turistas israelenses no estado.

O caso foi remetido para a Justiça Federal em Brasília – competente para analisar pedidos de prisão de estrangeiros – e, no último dia 30 de dezembro, durante plantão judicial, a juíza Raquel Soares Charelli determinou que a PF instaurasse inquérito para investigar o soldado.

Seguindo parecer do MPF, a juíza, no entanto, negou o pedido de prisão do militar, bem como a apreensão de celular e passaporte, para que ele fosse impedido de deixar o Brasil. Alertado pelas autoridades israelenses, o soldado deixou o país e se dirigiu para a Argentina.

No parecer, o procurador Marcus Goulart afirmou que as imputações da Fundação Hind Rajab contra ele, apesar de “gravíssimas”, podem não passar de “narrativas” e “adjetivações”.

Com base em fotos em redes sociais, a ONG acusa o soldado de participar da destruição de um quarteirão residencial na Faixa de Gaza para a abertura do corredor Netzarim, uma linha de 7 quilômetros de largura, ocupada pelas forças israelenses, que separa as regiões sul e norte do território. Entidades pró-palestina alegam tratar-se de um local violento, onde soldados israelenses matariam civis palestinos por considerá-los terroristas de forma generalizada.

Para o MPF, as imputações da Fundação Hind Rajab que ligam o soldado a atrocidades na região são frágeis – a ONG o acusa de dois crimes de guerra previstos no Estatuto de Roma, do qual o Brasil é signatário:

  1. “destruição e apropriação de bens em larga escala em circunstâncias não justificadas por quaisquer necessidades militares e executadas de forma ilegal e arbitrária”; e
  2. “destruição e apropriação de bens em larga escala em circunstâncias não justificadas por quaisquer necessidades militares e executadas de forma ilegal e arbitrária”.

“A própria materialidade [dos crimes imputados ao soldado] está bem rarefeita, mesmo que se considere legítimos os documentos e imagens trazidos pelos representantes, eis que eles apenas demonstrariam a destruição de supostos edifícios particulares e a presença do representado na respectiva região, dentro de um contexto de guerra ou invasão militar, que inevitavelmente traz destruição, selvageria e horror”, diz o parecer do MPF.

“Não há nada nos autos sugerindo que [o militar] teria matado alguém ou efetivamente participado da destruição de propriedade privada sem ‘necessidade militar’. É igualmente precipitado tomar por certa a afirmação de que a alegada ‘expansão do corredor Netzarim’ constituiria uma empreitada de eliminação de um povo ‘motivada por ideologias supremacistas’”, continua ainda o parecer.

“Se é indiscutível que tais alegações são gravíssimas e precisam ser devidamente investigadas por autoridades independentes, não menos certa é a necessidade de manter-se uma boa distância das narrativas e sua adjetivações”, diz o documento.

O pedido da Fundação Hind Rajab para investigar e prender o militar não traz evidências diretas de crimes cometidos pelo israelense. Na maior parte das 43 páginas da petição, os advogados Maira Machado Frota Pinheiro e Caio Patrício de Almeida reproduzem artigos de ativistas pró-Palestina com acusações contra as forças israelenses no combate ao Hamas.

A suposta participação de dele é apresentada por meio de fotos em redes sociais em que ele aparece uniformizado como soldado em locais de aparente conflito.

Num trecho da petição, os advogados chamam a atenção para o fato de aparecer sorrindo. “[O militar] posa sorridente diante de imóveis claramente residenciais enquanto explosivos são instalados para posterior realização de demolição controlada”, dizem.

Noutra parte, destacam o fato de a postagem ter como fundo musical trilha sonora de um game violento. “A música escolhida pelo noticiado como trilha sonora de sua postagem de memórias de crimes de guerra é a do jogo de videogame Grand Theft Auto, no qual a personagem principal é um criminoso que explora cidades fictícias, realizando missões criminosas como agredir pessoas e roubar carros e até mesmo aviões”.

Dentro do Ministério Público Federal, a possibilidade de avanço nas investigações, no Brasil, é considerada incipiente. Apesar de legalmente possível – em razão da Convenção de Genebra e do Estatuto de Roma, que impõem aos Estados-parte a obrigação de colaborar com a perseguição a acusados de crimes de guerra –, no caso do israelense, as acusações são frágeis e os meios de investigação bastante limitados.

A primeira razão, mais concreta, é o fato de o soldado já ter deixado o Brasil e, assim, não ter tido o celular apreendido, nem ter sido interrogado sobre o caso na PF. Informações colhidas poderiam, em tese, alimentar um procedimento contra ele no Tribunal Penal Internacional (TPI), sediado em Haia, na Holanda.

Ainda assim, o soldado é considerado um “peixe pequeno”, um combatente comum dentro da máquina militar de Israel, sem poder de comando e, portanto, sem alta responsabilidade direta por eventuais excessos e abusos no combate ao Hamas.

Investigadores experientes veem na iniciativa da Fundação Hind Rajab uma estratégia política. Nos últimos meses, a ONG vem tentando prender soldados israelenses que viajam a turismo para o exterior, como parte de uma campanha para reforçar a condenação moral ao Estado de Israel em âmbito internacional, aproveitando a comoção de parte da comunidade jurídica e intelectual, em vários países, identificada com causas progressistas, em favor dos palestinos.

A simples abertura do inquérito, de qualquer modo, revoltou o governo de Israel. A embaixada israelense em Brasília criticou a decisão da Justiça brasileira e afirmou que Israel “está exercendo seu direito à autodefesa após o massacre brutal cometido pelo Hamas em 7 de outubro de 2023”. “Os verdadeiros perpetradores de crimes de guerra são as organizações terroristas, que exploram populações civis como escudos humanos e utilizam hospitais e instalações internacionais como infraestrutura para atos de terrorismo direcionados a cidadãos israelenses”, afirmou.



Acesse esta notícia no site do Gazeta do Povo – Link Original

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